Diário do Nordeste - CECaderno 322/05/2009
REFORMA DA LEI ROUANET - O Ceará no debate
O ministro da Cultura, Juca Ferreira, participa hoje de audiência em Fortaleza. Em foco, as mudanças no financiamento público a projetos culturais, com a reforma da Lei Rouanet
Seguindo um itinerário por diversas capitais, o ministro Juca Ferreira participa esta tarde de Audiência Pública em Fortaleza, apresentando a parlamentares, artistas e produtores as propostas do Ministério da Cultura para mudanças na legislação federal de incentivo à cultura, via financiamento público de projetos. Disponível desde março último na página do Ministério na Internet, com um chamamento ao envio de sugestões, o anteprojeto de Lei que trata da reforma da Lei Rouanet será debatido a partir das 14h30, na Assembléia Legislativa. A audiência também deverá marcar a entrega ao ministro Juca Ferreira de sugestões para a nova lei, elaboradas pelos secretários de Cultura dos estados nordestinos, que se reuniram semana passada na capital cearense.
Entre as sugestões defendidas pela Secretaria de Cultura do Estado do Ceará, a principal, segundo o secretário Auto Filho, é a modificação na forma de repasse de recursos da União para os estados e municípios. ´A redação proposta no anteprojeto de revisão da Lei Rouanet determina que essa transferência de recursos se fará via seleção pública de projetos culturais. Estamos propondo que se faça o repasse de forma automática, não vinculada à aprovação pelo Ministério de projetos culturais enviados pelos estados e municípios´, ressaltou o secretário, em entrevista ao Caderno 3, categórico quanto à necessidade dessa mudança. ´Se não for assim, vai se dar o mesmo problema de hoje: nós disputamos os projetos do Mecenato e do Fundo Nacional de Cultura, mas os recursos ficam concentrados no Sudeste, mesmo que tenhamos apresentado projetos em quantidade e de qualidade´.
A necessidade de modificar o cenário de concentração de recursos citado pelo secretário cearense é a principal justificativa do Ministério para a reforma da Lei Rouanet. A promessa uma meçhor divisão do bolo, que hoje contempla com fatias mais generosas os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Entre as mudanças estão o fortalecimento do Fundo Nacional de Cultura, a transferência de recursos da União aos estados e municípios e a criação de fundos setoriais para cada linguagem artística.
“Proposta bem acolhida”
Segundo o secretário da Identidade e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, Américo Córdula, as audiências públicas realizadas sobre o tema em diversas capitais vêm recebendo boa acolhida - salvo por ´setores´ do Rio de Janeiro e de São Paulo. ´Quase que na totalidade dos estados tem sido muito bem recebida a proposta de reformulação da Lei Rouanet. Até por conta do histórico: são quase 18 anos da atual lei, que privilegiou sempre dois estados´, aponta. ´Na maioria das vezes, as pessoas entendem que essa modificação trará benefícios a quem ainda não conseguiu ser contemplado´.
Chamando atenção para a criação dos novos fundos setoriais - para artes, leitura, patrimônio, diversidade cultural, cidadania e demais segmentos -, que se somam ao já existente Fundo do Audiovisual, Américo sustenta que a nova legislação facilitará a vida dos artistas e produtores. ´Hoje o proponente passa pela seleção da Lei Rouanet e, quando recebe a carta dizendo que pode captar, tem que entrar numa segunda seleção, que é privada. Os departamentos de marketing das empresas é que escolhem que projetos atender´, enfatiza. ´Os jovens, ou artistas que não têm visibilidade, não conseguem patrocínio. Os fundos vêm para atender esse segmento´.
Mostrando preocupação com uma possível polarização do debate entre Rio e São Paulo de um lado e os demais estados de outro, Américo ressalta que a reação às mudanças na legislação viriam de ´setores´ dos estados sudestinos - não da totalidade de seus produtores, artistas e gestores culturais.
´A questão não é com os estados. É com os segmentos que têm hoje aproveitado essa captação. Na verdade, há uma reação dos que vão se sentir prejudicados, principalmente com a lei de incentivo, que vai continuar, mas vai ter mais faixas de isenção´, especifica. ´Por exemplo, os povos indígenas, os ciganos, nesses estados inclusive, têm dado um apoio muito grande (à mudança de legislação), porque eles não têm acesso. O fundo da diversidade cultural vai ter uma possibilidade de contemplar os seus projetos´.
Tarde demais para mudanças?
Questionado sobre como as sugestões feitas pela Secult-CE e as propostas que venham a surgir na audiência pública de hoje em Fortaleza poderão ser incorporadas ao novo anteprojeto de lei - tendo em vista que já foi esgotado o prazo de 45 dias para consulta pública sobre o tema-, Américo Córdula admite dificuldades para acolher possíveis modificações, a essa altura do processo. ´Não sei, legalmente, como é que a gente vai aceitar, porque o prazo realmente terminou no dia 6 de maio. Mas, pela quantidade de contribuições de vários estados, talvez as sugestões do secretário Auto Filho já possam estar sendo contempladas. Vamos ver´, declarou. ´A gente vai receber e ver de que maneira pode atender a essas demandas´.
Diante dessa realidade, o representante do Ministério da Cultura aponta que as audiências públicas têm ainda o propósito de ´sensibilizar´ os parlamentares federais de cada estado, já preparando a defesa do projeto para sua tramitação no Congresso, que deverá se iniciar após a sistematização das propostas recebidas. ´O próximo passo agora é a submissão do projeto ao Congresso, onde vai existir uma pressão muito grande, dos segmentos que se sentem prejudicados. Um dos objetivos dessas reuniões é sensibilizar os deputados e senadores, de modo que entendam essa proposta, pra que a gente possa de fato tornar essa lei mais democrática, acabar com as assimetrias´. (DM)
DALWTON MOURA
Repórter